Além do casual

Não era a primeira vez dela em Londres, porém, muita coisa havia mudado desde então. A Terra da Rainha agora tinha um rei, seu filho, que assumira o trono após a morte da mãe, e ela própria tinha uma herdeira. Era a primeira viagem internacional da bebê e o primeiro lugar que a mulher quis que a filha conhecesse. A cidade onde ela havia se apaixonado e sido correspondida pela primeira vez, evento o qual a motivou a acreditar que tinha o direito de ser feliz, sem o qual talvez nunca tivesse gerado uma criança.

As duas estavam na varanda do hotel terminando o café da manhã, quando, em uma conferida nas redes sociais de seu ator favorito, ela descobriu que o homem estava gravando na cidade aquela manhã. Buscando informações sobre o filme, a mulher se deparou com um convite irresistível. A equipe de filmagem estava procurando uma criança menor de 1 ano para gravar com o ator na cena final do filme.

Seria um trabalho pequeno, o que não cansaria o bebê e havia um cachê a ser pago para os responsáveis pela criança. Entretanto, não foi o dinheiro que despertou nela o desejo de levar a filha para o teste. A cena seria com o ator principal do longa e o ator nesse papel era exatamente quem ela adoraria rever naquela viagem.

(…)
— Será que eu sou tão feio assim que assusto todas as crianças? — Havia sarcasmo na voz do ator, mas ele estava começando a ficar preocupado por não conseguir que nenhum dos bebês que haviam aparecido para o teste ficasse tranquilo em seus braços.

O diretor apenas riu para ele e foi buscar a próxima mãe que havia inscrito a filha no teste. Ele a reconheceu imediatamente e por alguns instantes ficou preocupado, mas em questão de segundos estava rindo do próprio raciocínio. Havia passado uma noite maravilhosa com aquela mulher, era fato, mas já havia sido há 5 anos. Era impossível que a criança fosse sua. Ficou feliz por vê-la com uma bebê nos braços, mas foi um sentimento agridoce.

— Você lembra de mim — disse ela sorrindo ao perceber a forma como o ator a observava. — Não achei que isso iria acontecer.

O diretor olhou para os dois, mas se afastou sem mais perguntas se acomodando em sua cadeira para observar como a bebê iria se comportar. A mulher se sentou no banco ao lado dele ainda segurando a filha.

— Acho que não te disse na época, mas não é o tipo de coisa que eu costumo fazer. Não misturo trabalho com lazer, mas quando eu vi você senti que deveria ignorar isso.

O coração dela bateu numa velocidade diferente por alguns instantes e o desejo de que ele fosse o pai da menina passou como flash em sua mente.

— Vai com ele, amorzinho — disse para a bebê antes de colocá-la no colo do ator.

A pequena olhou para a mãe que sorriu para tranquilizá-la e o homem começou a interagir com a criança.

— Assim que te vi, a primeira coisa que pensei foi que ela era minha filha — admitiu ele feliz com a resposta positiva que recebia da bebê à vontade em seu colo.

— Acho que ela é meio pequena pra uma criança de 5 anos — respondeu a mãe rindo.

— É, eu cheguei a essa conclusão — afirmou ele também com um sorriso. — Seu marido veio com você?

— Não sou casada… — ela abanou a cabeça em negativa.

— Eu quero dizer o pai dela. — Ele ficou um pouco sem graça com a dedução, temendo ter tocado em um assunto sensível para ela. — Está aqui com vocês?

— Não, — o sorriso da mulher foi um pouco mais tímido, mas sua história não era nenhum segredo. — A gente namorou por alguns meses, mas ele nunca quis ser pai. Só que não chegamos a conversar sobre o assunto.

— Te abandonou quando você engravidou?

— Mais ou menos. É verdade que ele não quis se envolver emocionalmente, mas assim que eu disse que não queria interromper a gestação, ele se comprometeu a nunca deixar faltar nada na parte financeira. Não que eu precisasse, mas é o mínimo que ele deve fazer e é direito dela. Não me envolvi com mais ninguém depois dele. É mais arriscado com ela. — A mãe acariciou os cabelos da filha que continuava tranquila no colo do ator.

Percebendo que tudo estava correndo tranquilamente, o diretor resolveu colocar mais pessoas para circularem no cenário simulando como seria durante a gravação.

— Arrependida? — perguntou o homem sem saber se estava sendo invasivo demais e acrescentou logo depois, — tudo bem se não quiser responder.

— Nem um pouco, — o sorriso da mulher era sincero e ela se sentia à vontade conversando com ele. Era sempre o rosto e a voz dele através dos filmes e séries que estava presente em seus momentos mais solitários. — Depois de um período de adaptação, e como a questão financeira não é um problema, tem sido ótimo acompanhar ela crescer. Minha única preocupação é quando ela quiser conhecer o pai. Vai ser mais triste pra ela ficar sem o carinho dele do que é para mim. É a única coisa da qual me arrependo. Devia ter pensado mais nas consequências do que estava fazendo.

— Não usaram proteção?

— Usamos, — ela abaixou a cabeça e riu. — E juro que passou pela minha cabeça se eu não deveria processar a empresa que produz os preservativos.

Os dois gargalharam e a bebê, mesmo sem compreender o que se passava, deu uma risadinha.

— Só tem um método 100% garantido… — acrescentou a mulher.

— É verdade, mas até esse falhou certa vez…

— Fato, mas o anjo Gabriel pediu permissão primeiro então ela sabia o que iria acontecer.

Ela sorriu e olhou para a medalhinha dourada de São Cristóvão que o ator tinha pendurada no pescoço antes de olhar para ele. O homem sorriu de volta focando no pequeno crucifixo no pescoço dela antes de encarar seus olhos.

— De qualquer forma, o jeito agora é dar a ela todo o amor que eu puder e escolher bem a terapeuta — continuou a mulher.

— Acho que no fim vai dar tudo certo.

— Certo? Isso vai ficar maravilhoso! — O diretor havia se aproximado sem que os dois percebessem e estava bem animado com a tranquilidade da criança com todo barulho que ele havia feito. Queria agora a prova de fogo. — Você se afastaria um pouco? Até a minha cadeira? — Ele apontou para o local.

— Sim, — disse ela sossegada por ainda ter a filha no seu campo de visão. — Amorzinho, — disse ela para a menina depois de se levantar. — A mamãe já volta, tá? Fica um pouquinho com o papai de faz de conta que eu arranjei pra você. — Ela beijou a cabeça da filha e sorriu para o ator que retribuiu o gesto.

A dupla se virou e caminhou para longe.

— Por falar no pai dela, vou precisar da assinatura dele também para gravar as cenas.

— Tem problema se o documento for assinado a distância? É que ele está no Brasil…

O diretor olhou espantado para a mulher antes de se acomodar em sua cadeira.

— Achei que vocês fossem daqui.

— Não, — confirmou ela. — Acha que isso será um problema?

Nope — confirmou ele com um sorriso sincero.

O diretor se sentia tão aliviado por ter conseguido uma criança para gravar, que estava disposto a falar pessoalmente com o rei caso fosse preciso. Já estava ficando preocupado tentando encontrar uma solução para a conseguir gravar a cena final do pai que finalmente ganhara a batalha judicial contra a família de sua falecida esposa e ficara a guarda da filha do casal.

Os dois ficaram olhando os atores circulando pelo espaço enquanto ele brincava com a bebê ainda muito à vontade. Sentimentos surgiam nos corações do homem e da mulher enquanto lembravam de seu encontro casual, responsável por criar uma conexão que parecia ir além do que eles imaginavam.

Ainda estou tentando escrever essa história sem nomes, mas está cada vez mais difícil. Esse casal quer se apresentar e acho que vai ser impossível continuar dessa maneira impessoal.

Para ler como foi o primeiro contato desse casal, acesse: Casual (aqui mesmo no blog)

10 comentários:

  1. Engraçado que, lendo o conto, não consegui imaginar o rosto da heroína. Mas no caso do ator, o rosto imaginado foi do Martin Freeman.

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    1. Preciso confessar que eu escrevendo também não consigo imaginar outro senão ele. Quis deixar esse conto bem aberto, para que as pessoas imaginassem quem quisessem. Mas, como falei no final desse, vou acabar dando mais personalidade e nomes para esses personagens.

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  2. Muito bom este conto, parabéns.

    Arthur Claro
    http://www.arthur-claro.blogspot.com

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  3. Oi, Helaina. Tudo bem? Conto sensacional. Você escreve muitíssimo bem. Parabéns! Abraço!


    https://lucianootacianopensamentosolto.blogspot.com/

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    1. Oi Luciano, tudo bem e você? Muito obrigada!
      Fico feliz que tenha gostado!
      Abraço!

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  4. Uau, você escreve bem mesmo! Continua essa história por favor!
    Bjs e fk c Deus
    Nana
    http://procurandoamigosvirtuais.blogspot.com

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    1. Muito obrigada! Tenho vontade de continuar ela sim, só não sei quando farei isso, mas estou ficando apegada o suficiente pelos personagens para continuar.
      Beijos;
      Fica com Deus você também!

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  5. fiquei curiosa com o resto do conto
    https://retromaggie.blogspot.com/

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    1. Ainda não sei que caminho tomarei com ele, mas já estou pensando em desenvolver melhor os personagens para futuras aparições.

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