Annabelle jogou a cabeça para trás e mexeu o pescoço de um lado para o outro assim que terminou de recolher a louça suja deixada na mesa pelas duas clientes que haviam acabado de sair do Art's Café.
— Cansada? — perguntou Felipe que trabalhava como caixa no café de seu pai, Arthur.
— Com calor… — respondeu a funcionária que usava um avental bege de sarja lisa com detalhes estampados nas cores vermelho e verde na barra, perto do pescoço, em volta de um único bolso e da fita para amarrar na cintura. Sobre esse bolso, ainda havia um Papai Noel bordado em patch aplique e ponto caseado. Ela tirou a bandana, da mesma estampa dos detalhes coloridos, já um pouco úmida na região das orelhas.
— Vou diminuir mais um pouco a temperatura do ar-condicionado — avisou o homem pegando o controle remoto branco. Como não estava atendendo as mesas naquele dia, ele usava suas roupas comuns, jeans e camiseta azul de mangas curtas com estampa remetendo a um filme de fantasia.
A mulher sorriu para o amigo em agradecimento.
— Ano que vem a gente vai! — afirmou ele com convicção.
— Vamos ver.
Com a chegada de novos clientes, a mulher precisou interromper a conversa. O café estava movimentado, pois um local fresco para descansar e fazer um lanche no clima quente da última semana antes do Natal, era tudo o que as pessoas queriam. Quase um oásis no deserto.
Somente perto do final do expediente, quando havia apenas um casal acomodado na mesa perto da vitrine tomando cappuccinos gelados acompanhado por uma porção de pão de queijo, Annabelle retomou o assunto da viagem.
— Acho que nunca vou me sentir à vontade para estar longe da família no Natal — disse ela puxando uma das cadeiras perto do caixa para sentar. — Não é pelo peso da culpa, — ela sorriu lembrando que no ano anterior os dois tiveram a mesma conversa. — Só acho estranho mesmo.
— Bom, a gente pode ir depois do Natal — sugeriu Felipe. — A neve não vai embora com o Papai Noel.
A mulher riu com vontade.
— Vou ver se consigo me organizar, financeiramente falando.
— Não se preocupe com isso — disse Felipe antes de voltar a atenção para o casal que agora estava em pé ao lado do caixa esperando para pagar a conta.
Annabelle foi até a mesa deles e recolheu a louça suja para levar até a cozinha. Ela mesma lavou os utensílios e guardou, pois a funcionária responsável já havia sido liberada por Felipe que declarou não haver problema em realizar as últimas tarefas dela. Com a cozinha limpa e organizada, restava apenas higienizar as mesas e varrer o chão.
— Eu disse que assumiria a função — reclamou o homem entrando na cozinha depois de fechar o café ao ver a amiga guardando a louça limpa e seca no armário.
— Hora extra pra juntar dinheiro pra viagem — ela deu um sorriso debochado. — E se você me acompanhar até em casa, economizo o do ônibus.
Felipe sorriu e sem que ele pedisse, Annabelle pegou um pano e umedeceu com álcool para poder higienizar as mesas. O homem se apossou da vassoura e os dois foram para a parte da frente da loja.
— Qual foi mesmo o tema que seu pai encomendou na decoração de Natal?
Perguntou a mulher limpando uma mesa perto da grande árvore com tantos enfeies que mal se via seus ramos.
— Brinquedos antigos — informou o homem. Sem querer sobrecarregar seu filho com a tarefa, como fizera no ano anterior, Arthur resolveu contratar uma empresa para decorar o local. Era uma equipe muito competente, e a decoração colorida e aconchegante ficou pronta em poucas horas.
— É, tem umas coisas que lembram minha infância, já outras… — Annabelle encarava uma boneca de pano com cabelos vermelhos e vestido branco enquanto franzia as sobrancelhas.
— Alguma espécie de identificação, Annabelle? — Felipe brincou se aproximando da amiga ao fazer a associação do nome dela com a boneca da franquia de terror, mas se assustou junto com ela por conta do clarão do relâmpago que iluminou o café.
A mulher sorriu e mostrou a língua para ele antes de se afastar sem se ofender com a brincadeira.
— Abençoada seja essa chuva por refrescar o calor — comentou ela começando a higienizar a próxima mesa.
— A gente vai para Londres ou Nova Iorque?
— Olha, mas já estamos pensando no destino? Eu nem sei se tenho roupa pra isso.
— Provavelmente não — afirmou ele. — Melhor comprar algo que aqueça de verdade.
— Por falar em aquecimento, pode desligar o ar-condicionado se quiser. Esse tempo chuvoso já fez cair a temperatura — a mulher estava observando o novo presépio, maior que do ano anterior, sobre a estufa de pâtisserie. O antigo havia sido colocado ali de improviso por conta de um comentário dela, o atual foi comprado pensando no local que ocuparia e completava a decoração com perfeição.
— Belle, olha isso — Felipe, perto da vitrine do café, olhava admirado para o lado de fora.
A mulher parou ao lado do amigo e ficou tão encantada quando ele com os pequenos objetos brancos que dançavam ao sabor do vento. Parecia uma nevasca, mas ambos estavam cientes que não chegava nem perto de ser algo como isso. Com mais um relâmpado a tempestade começou encharcando as pequenas pétalas e acabando com a atração.
— Nossa neve improvisada — Annabelle riu se afastando da vitrine para limpar uma última mesa.
— De qual planta elas vieram? — quis saber o homem.
— Não faço ideia…
— Mas você não é bióloga? — continuou ele enquanto ia pegar a pá para recolher o lixo que havia terminado de varrer para jogar fora.
— Sim, mas favor não confundir com Wikipedia.
Felipe deu uma gargalhada.
— Botânica nunca foi meu forte — admitiu ela.
— Não gostava?
— Na época não.
— Mudou de ideia?
— Era uma matéria complicada, mas fascinante. Talvez eu só fosse nova demais pra perceber isso — ela cruzou os braços segurando o pano e a pequena garrafa de álcool enquanto olhava para o amigo com um sorriso sereno.
— Vontade de voltar pra faculdade?
Dessa vez foi ela quem riu alto.
— Não é pra tanto… — afirmou. — Além disso, atrapalharia nos planos de viagem.
A dupla trocou um sorriso.
— Londres! — disse ela de repente. — Olha, eu adoraria conhecer Nova Iorque também, mas tem Harry Potter, Sherlock Holmes, aquela árvore gigante do Covent Garden, o chá tradicional completo que deve ser uma experiência incrível e imagino que um passeio na London Eye deve valer muito à pena!
— So, London it is!
Aquela decisão deu ânimo para Annabelle começar a sonhar com a possibilidade de sua primeira viagem internacional. Mesmo sabendo que precisaria economizar muito, ter o destino e a companhia fazia o resto parecer um mero detalhe. O que ela não sabia era dos planos de Felipe para fazer aquela aventura acontecer. Não seria sua primeira vez, mas estava empolgado para apresentar à amiga uma parte do mundo que ela não conhecia. O homem pagaria tudo ou emprestaria o dinheiro que faltasse, se fosse preciso, para não desistir da ideia.
Interessante essa ideia de casais que não se relacionam romanticamente, mas são amigos. Espero que dê tudo certo no projeto de viagem deles.
ResponderExcluirAbraço,
www.oguardiaodehistorias.com.br
Olha, não sei até quando vou resistir à vontade de transformar esses dois em um casal romântico, mas por enquanto estou gostando de curtir a amizade. Existe uma pressão, às vezes quase imperceptível, que pessoas que se amam são obrigadas a formar um casal romântico, independente do gênero. Acho que isso está entranhado na mente da gente e é um sacrifício contornar.
ExcluirAguardemos até o próximo Natal.
Abraço;
Hum, aguardando ansiosa o próximo capítulo! Vc escreve muito bem!
ResponderExcluirBj e fk c Deus
Nana
https://procurandoamigosvirtuais.blogspot.com/
Muito obrigada!
ExcluirFique de olho no marcador Cappuccino que sempre haverá histórias com esses personagens.
Beijos e fica com Deus você também.
Muito bem! Espero ler a continuação.
ResponderExcluirBeijos e bom domingo!
Fico feliz que tenha gostado!
ExcluirPara ler mais desses personagens acesse o marcador: Cappuccino
Beijos e um bom domingo para você também!