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O Último Suspiro 2

O fim de tarde com o por do sol jogando seu brilho alaranjado nos abraçava, mas o sentimento que compartilhávamos não era tão dourado quando aquele cenário. Estávamos juntos há quase um ano. Entendíamos um ao outro como ninguém mais. Porém, nem toda aquela cumplicidade nos deixava livres de tomar uma decisão difícil de vez em quando. Uma em que nós dois sairíamos indubitavelmente feridos.
 
Nossos olhares se encontraram timidamente. Ambos sem saber por que tínhamos que chegar àquele ponto. Depois de tantos meses, tantas conversas sussurradas ao ouvido, precisávamos tomar uma decisão antes que a escuridão dominasse o parque já quase sem frequentadores. 
 
Apenas os poucos pássaros, à procura de uma árvore onde dormir, seriam as testemunhas. Isso era bom, mas não tirava o peso da escolha difícil. Era muito amor envolvido. Eu duvidava da possibilidade de encontrar nova companhia equivalente ao que estávamos vivendo. E tenho certeza que era recíproco. Considerávamo-nos almas gêmeas.

Havíamos trazido de tudo para o encontro planejado, menos um item que tornaria mais fácil aquela questão. Uma faca. Sem o objeto precisaríamos usar as próprias mãos e o desfecho não seria benéfico para nenhum de nós. Talvez apenas para os pequenos animais ocultos pela grama.

Meu verdadeiro País das Maravilhas

O país dos sonhos não tem nome nem é limitado geograficamente, mas ele existe, disso tenho certeza, só precisamos encontrá-lo, como Sophie encontrou o dela.

O telefone toca.
— Alô — atende a mãe de Sophie.
— Mãe! Oi!
— Oi! Tudo bem com você, filha?
— Tudo ótimo, mãe! E com você?
— Estou bem, mas estou com saudade...
— Ahh... Desculpe-me por não estar aí com você.
— Não se preocupe com isso. Você está feliz?
— Muito, mãe!
— Como são as coisas aí?
— Maravilhosas, mãe! Aqui não faz o calor que fazia aí em casa e outro dia até nevou. Ah, e as pessoas! São tão agradáveis. Tenho vários amigos, mas eles não ficam me convidando para festas todo final de semana. Ao invés disso nos reunimos na segunda-feira na hora do almoço para comentar sobre os livros que lemos no final de semana ou dos filmes que assistimos. Algumas vezes vamos todos juntos ao cinema. E, ah, mãe, como as pessoas aqui são educadas. Ninguém ouve música alta demais para não perturbar os outros, mas por mim podiam ouvir. Todos aqui gostam de música clássica ou das trilhar sonoras instrumentais dos filmes. Algumas vezes eles ouvem rock também. Aqui não preciso me preocupar com meus ouvidos — Sophie sorriu.
— Você conseguiu um lugar para morar?
— Consegui sim, mãe! É um apartamento bem pequeno, mas como estou morando sozinha, não tem problema. Tem um quarto, banheiro, cozinha e uma sala com estantes repletas de livros. Muitos deles presentes dos meus amigos.
— E o coração? Como está?
— Cheio de felicidade, claro!
— Então você está namorando?
— Ai, mãe, não. Mas tenho meus amigos, os livros, liberdade...
— Mas você sempre tudo isso aqui, não teve?
Sophie ficou calada por alguns instantes. Precisava pensar na resposta. Não queria magoar a mãe que além de parecer não conhecer muito bem a vida que a filha levava antes, nunca tinha percebido o quanto ela era infeliz, fazendo um enorme esforço para se levantar da cama todas as manhãs e ainda assim agradecendo a Deus a vida que tinha.
— Sempre tive mãe. A diferença é que antes tudo isso estava preso dentro dos livros, agora está livre do lado de fora.
— Filha...
— Sim mãe.
— Quando você volta pra casa?
Parece que a mãe de Sophie não tinha ouvido uma palavra sequer da conversa ou não queria aceitar o que ouvira.
— Um dia mãe. Prometo que eu volto.
— Te amo filha.
— Também Te amo mãe.
Sophie desligou o telefone. Soltou um grande suspiro. Sentou-se na poltrona da sala e abriu um livro.

O Último Suspiro



Eu não sei como chegamos a esse ponto. Depois de tantos meses, tantas conversas sussurradas ao ouvido e agora eu tinha que decidir o que fazer. Seja lá qual fosse a decisão, estaria acabado, não haveria volta.

Não sei se conseguiria fazer a escolha sozinho. Eu te amo profundamente, mas outra pessoa que eu também amo está em jogo; eu. Sei que parece egoísmo, mas nessa situação eu tenho que pensar em mim também. Droga! Porque tínhamos que chegar a esse ponto?

Espero que não me arrependa da decisão que tomarei, mas sou eu ou você. Porque eu não trouxe uma faca? Estar apenas com essa embalagem plástica nas mãos deixava as coisas piores. Mas não havia mais tempo para arrependimentos.

— Amor... — chamei com a voz mais tenra que podia estando tomado pela dor da decisão que acabara de tomar. — Pode comer o último suspiro, depois a gente compra mais!


Assustados?
Alguém adivinhou sobre o que se tratava a decisão difícil antes do final?