[Poema] À Noite

A música ao fundo é o Bolero de Ravel.
Não está nem frio nem quente. 
Apenas agradável.
A lentidão da internet permite pequenas viagens.
 
No teto do quarto, o lustre jaz cheio de insetos mortos. 
Uma aranha aproveitou e teceu sua teia ao lado, 
pronta a capturar qualquer desavisado que passe por ali.
O download de um vídeo de 8MB tem previsão de terminar em 30 minutos.
 
Haverá bastante tempo para viajar.
O relógio da cozinha trabalha ruidosamente.
Talvez porque o silêncio esteja sendo cortado 
apenas pelo barulho das teclas à medida que o texto é digitado.
Na cama não há lugar para dormir. 
 
Tudo que foi usado durante o dia está jogado sobre ela 
o que faz lembrar que logo terá de dobrar uma pilha enorme de roupas.
Quem manda ir a tantos lugares.
 
Os barulhos da vizinhança são um pouco assustadores.
Nunca se sabe se alguma casa está sendo invadida, 
ou se alguém simplesmente levantou-se da cama para ir ao banheiro.
Deixar a imaginação sempre aberta tem seus prós e seus contras.
 
A última vez em que ela foi deixada livre 
terminou com um medo de escuro que demorou alguns meses para desaparecer... 
Não por completo.
 
Acho que o Ravel não vai esperar o final do download... 
Não esta nem na metade.
Um refrigerante doce traz um pouco da energia de volta.
 
E se tudo ganhasse vida? 
E quem fosse vivo ficasse inanimado?
Os ímãs de bicho no quadro de aviso saem andando, 
procurando um lugar para se esconder da claridade.
 
Os bichos de pelúcia andam pelo quarto.
Os livros começam a conversar, 
cada um contando sua história para o outro.
Os móveis rangem e se acomodam em diferentes posições.
E o único ser antes vivo no quarto agora permanece em uma cadeira.
 
Sem vida.
 
Uma boneca de pano com os olhos de vidro.
 
E o download não terminou.

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